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Cagarro Joël Bried
Calonectris borealis (Cory 1881)
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O Cagarro, Calonectris borealis (Cory 1881), é uma ave marinha de porte médio... Continua...
Joël Bried – Biólogo
Investigador pós-doc na Universidade dos Açores – Departamento de Oceanografia e Pescas entre 2001 e 2013
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Bióloga
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O Cagarro, Calonectris borealis (Cory 1881), é uma ave marinha de porte médio. Pode ser identificado pela cor das partes superiores (cinzento-acastanhado) contrastando com as partes inferiores brancas. O bico amarelo é também conspícuo. Com um comprimento corporal médio de 50 cm e uma envergadura média de 1,25 m, Calonectris borealis é a maior pardela que nidifica no hemisfério Norte. O seu voo é caracterizado pelos poucos movimentos de asas alternando com fases de deslizamento durante as quais as aves rasam as ondas com agilidade. Pelo contrário, e tal como a grande maioria de espécies de Procellariiformes (ordem taxonómica que inclui os albatrozes, as pardelas e os paínhos), os Cagarros são muito desajeitados quando aterram e têm de se deslocar em terra.

Até há poucos anos atrás, considerava-se que o Cagarro era a subespécie borealis de Calonectris diomedea. Calonectris borealis nidifica essencialmente no Atlântico (ilhas Berlengas, arquipélagos dos Açores, da Madeira e das Canárias). No entanto, as colónias situadas a oeste de uma linha Almeria-Oran no Mediterrâneo são principalmente ocupadas por esta espécie. Calonectris diomedea (Scopoli 1769), (antigamente, a subespécie diomedea), de porte ligeiramente inferior, nidifica no Mediterrâneo, a Leste desta linha. Contudo, foi recentemente descoberta uma pequena população (apenas alguns casais) de C. diomedea na costa atlântica francesa.

Os Açores albergam cerca de 188000 casais reprodutores de Cagarros, ou seja, cerca de 75% da população mundial da espécie C. borealis. O Cagarro nidifica em todas as ilhas do arquipélago dos Açores, tanto nas ilhas principais como nos ilhéus.

O Cagarro não é considerado ameaçado a nível mundial. A revisão taxonómica deveria resultar num novo estatuto de conservação da espécie na Europa. Embora os C. diomedea sofram uma grande mortalidade causada pelas pescarias no Mediterrâneo, o impacto das pescarias sobre os C. borealis, que nidificam nos Açores, parece negligenciável por enquanto.

Nos Açores, os Cagarros adultos voltam a ocupar os seus ninhos a partir do final de fevereiro. Os ninhos são colocados em cavidades naturais e fendas na rocha. Contudo, os Cagarros podem reutilizar luras de coelho no solo ou escavar o seu próprio buraco, que pode atingir mais de dois metros de profundidade. Os acasalamentos ocorrem até meados de maio, antes das fêmeas regressarem para o mar, onde vão armazenar as reservas energéticas e os nutrientes de que vão precisar para por o seu ovo. Os machos podem abandonar as colónias durante este período também, embora a duração da sua ausência seja inferior. Tal como acontece em todas as espécies de Procellariiformes, cada fêmea põe um único ovo, sem possibilidade de efetuar uma postura de substituição em caso de fracasso durante a incubação. As posturas decorrem essencialmente no final de maio (início de junho no que concerne ás mais tardias). Os dois progenitores trocam turnos durante a incubação que dura 54 dias em média. As crias eclodem durante a segunda metade de julho. São alimentadas à noite pelos dois progenitores e saem dos ninhos entre o final de outubro e o início de novembro. Tal como acontece em todas as espécies de pardelas, os adultos mostram uma grande fidelidade ao ninho e ao parceiro de um ano para o outro. Contudo, isto não impede que aconteçam paternidades "extra-conjugais", as quais abrangem cerca de 11% das crias no ilhéu da Vila (Santa Maria).

Nas águas açorianas, é frequente observar bandos de Cagarros a alimentarem-se em associação com outros predadores marinhos, tais como cetáceos e tunídeos, que dirigem as potenciais presas para a superfície. Na sua dieta incluem-se pequenos peixes epi- e meso-pelágicos (chicharros, cavalas, peixes-pau), pequenas lulas (Ommastrephidae) e, ocasionalmente, crustáceos e zooplâncton. Durante a criação, os progenitores adotam uma estratégia de pesquisa alimentar bimodal, alternando em média três viagens curtas (menos de 4 dias e num raio inferior à 590 km da colónia) com uma viagem longa (em média 8 a 12 dias, mas algumas podem durar 20 dias), que os pode levar até 1800 km da colónia e até 50 graus de latitude Norte.

Há registos de indivíduos imaturos com menos de 3 anos de idade oriundos dos Açores ao largo do Brasil. Contudo, a colocação de geolocalizadores sobre Cagarros adultos permitiu revelar a existência de duas zonas de invernada para os adultos, sendo a primeira ao largo das costas sul-americanas (Brasil, Uruguai), e a segunda ao largo da costa sul-africana até ao canal de Moçambique e oceano Indico ocidental.

Joël Bried – Biólogo
Investigador pós-doc na Universidade dos Açores – Departamento de Oceanografia e Pescas entre 2001 e 2013