Antiga ilha sustentada pelo cone vulcânico quase perfeito que se eleva a pique desde as profundezas dos 1800 metros até à superfície. Cenário hollywodesco de estórias de piratas e navios de carga afundados nos traiçoeiros ilhéus desde os primórdios da navegação trans-atlântica. Pérola do nosso património natural comum, com o seu casamento gracioso e único entre as comunidades das profundezas, do oceano aberto, e de uma costa que na verdade não existe.
De facto, o banco é, na sua essência, um típico monte submarino, habitado por peixes do mar profundo, bancos de corais e esponjas de profundidade. No entanto, podemos encontrar na parte superior do cone vulcânico – a área do bordo, delimitada entre os ilhéus das Formigas a noroeste e o recife do Dollabarat a sudoeste, e o interior da antiga caldeira, incluindo um outro antigo cone a meio – uma riquíssima e pujante comunidade típica dos habitats costeiros das ilhas. Abundam aqui os típicos Bodiões (Peixe-rei, Rainha), Castanhetas (amarela e preta), Garoupa, Veja, e os emblemáticos Mero, Badejo e Peixe-cão. Também os predadores pelágicos, alguns residindo no banco (Írio, Enxaréu, Bicuda), outros apenas o visitando no decurso das suas grandes migrações anuais (Jamanta, Tubarão Baleia). O fundo vulcânico nesta área mais superficial é recoberto por vários tipos de corais pretos (Antipatários) e moles (Corynactis), esponjas e outros invertebrados, e algas de todos os tipos, proporcionando uma diversidade e abundância de vida e formando um mosaico de micro habitats sem paralelo no arquipélago. A grande diferença da natureza geológica do fundo entre os ilhéus e o Dollabarat acentua esta variedade. Encontram-se aqui pelo menos dois ecótipos até agora considerados únicos no arquipélago e sustentados pela presença de biomassa muito elevada de duas algas castanhas: os campos de laminárias, situados nos fundos arenosos entre os 45 e os 60 metros de profundidade da cratera afundada, e as pradarias de Cistoseira nos fundos acidentados do recife do Dollabarat e banco do meio. Há poucos anos estes últimos cobriam toda a área, mas o desaparecimento de grande parte da pradaria a profundidades menores deixou muito do fundo do Dollabarat a descoberto, expondo também as outras algas, invertebrados e peixes que dependem das frondes de cistoseira para se manter, levando à sua redução drástica. Este desaparecimento pode dever-se a causas naturais que se prendem com a dinâmica das populações e, provavelmente, alterações locais no regime oceanográfico, mas releva a fragilidade deste tão singular ecossistema. Esta fragilidade é apenas acentuada pela pesca ilegal que, infelizmente, continua a ser praticada no banco das Formigas, quer utilizando palangres em busca de peixe de fundo (Mero, Abróteas, Goraz), quer pescando predadores pelágicos com isco vivo a coberto da excepção para os atuneiros. A remoção dos
predadores de topo tem efeitos ao nível de toda a comunidade, e pode reduzir a sua capacidade de resistência a alterações ambientais drásticas. Os estudos de monitorização no banco mostram que a abundância e os indivíduos de grande porte de predadores costeiros têm vindo a diminuir, e o mesmo deverá ser expectável para os peixes de profundidade. Um futuro próximo deverá concentrar-se na melhoria deste quadro, para que possamos continuar a ter esta jóia da coroa no nosso património.
Pedro Afonso – Biólogo
Departamento de Oceanografia e Pescas – Universidade dos Açores |