O vulcão das Furnas é um dos três potencialmente mais activos vulcões da ilha de São Miguel. Este vulcão está flanqueado, a oriente, pelo vulcão da Povoação, e a ocidente, pela zona fissural do Planalto da Achada.
À semelhança dos vulcões das Sete Cidades, do Fogo e da Povoação, o vulcão das Furnas é um estratovulcão ou vulcão compósito, constituído por alternâncias de escoadas lávicas e materiais piroclásticos, tais como, cinzas (< 2mm), lapilli-bagacinas (entre 2 e 64mm), bombas e blocos (>64mm). É igualmente um vulcão poligenético, por ter resultado de inúmeras erupções seriadas ao longo da sua história geológica.
Inicialmente o Vulcão das Furnas teria um aspecto morfológico semelhante à Montanha do Pico, porém, ao longo da sua evolução, e na sequência de sucessivos episódios vulcânicos, foi modificando a sua configuração, até atingir o aspecto actual. Para tal facto, terá contribuído, fundamentalmente, o desenvolvimento de uma câmara magmática subjacente ao mesmo, isto é, um reservatório onde o magma (rocha líquida, com gases e alguns cristais) terá permanecido e evoluído, através de processos geoquímicos e termodinâmicos altamente complexos, no decurso de um tempo geológico alargado. A evolução do magma conduziu ao enriquecimento de alguns elementos químicos, substancialmente sílica, determinantes no grau de explosividade de futuros episódios. A observação dos produtos vulcânicos emitidos durante as várias erupções (maioritariamente de natureza traquítica, isto é, muito ricos em sílica), associada à análise dos diversos depósitos e das várias estruturas, que integram este vulcão, permitiu reconstituir a sua história geológica.
Na realidade, verifica-se que na sequência daquela evolução magmática, terá ocorrido um importante cataclismo vulcânico, que há cerca de 30.000 anos, terá originado a primeira caldeira do vulcão das Furnas, com 8kmX5km de diâmetro. Durante um certo período, o interior da caldeira foi palco de outros fenómenos vulcânicos de menor magnitude, que antecederam um outro episódio catastrófico, que levou à formação de mais uma caldeira, com 6kmX3,5km de diâmetro. Este incidente deverá ter acontecido há aproximadamente 12.000 anos.
Depois do povoamento da ilha parece poder-se reportar a ocorrência de duas erupções. A primeira hipoteticamente em 1440, com provável Centro eruptivo no Pico do Gaspar e, a segunda, muito mais bem documentada, em 1630, a sul da Caldeira. Esta erupção apresentou inicialmente fases explosivas, de natureza magmática e freatomagmática (com introdução de água no sistema magmático), que envolveram a projecção de pedra-pomes e cinzas traquíticas. Uma fase efusiva, relacionada com a instalação de um domo traquítico (estrutura abaulada, convexa, resultante do carácter muito viscoso da lava que nestas condições não consegue progredir no solo), seguiu as anteriores. Actualmente, este domo, inserido no meio de um anel pomítico, é bem visível à entrada das Furnas, pelo lado sul da ilha, no início da Lagoa das Furnas.
Considerando que vivem cerca de 2000 pessoas no interior da caldeira, de um vulcão potencialmente activo, que tem registado ao longo da sua história cataclismos de grande magnitude vulcânica, é imperioso insistir na manutenção de um sistema de monitorização, incidindo, fundamentalmente, na recolha de dados sísmicos, de deformação de terreno e de análises químicas das águas e dos gases vulcânicos. O cruzamento destes dados pode contribuir para o prognóstico de algum fenómeno vulcânico, e, consequentemente, para a minimização de danos humanos e sócio-económicos.
Importa ainda realçar um outro problema que se prende com a saúde da população que diariamente vive nas Furnas. É imperioso que todos estejam consciencializados de que alguns dos gases vulcânicos, que os envolvem em neblinas quase místicas, podem provocar danos físicos, ou, em casos extremos, serem letais quando atingem determinadas concentrações.
Os vulcões exercem sobre as pessoas uma atracção inexplicável. Por todo o mundo as pessoas se difundem pelas suas vertentes. Os vulcões são misteriosos, divinais, imponentes, emanam respeito e produzem os solos mais férteis que se conhecem. Viver em tranquilidade com eles, em harmonia, não significa ignorar as suas potencialidades.
Zilda França – Vulcanóloga
Universidade dos Açores
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