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Conclusões de Furtado

No que toca à fauna malacológica dos Açores, Furtado (1881), duvidando da hipótese da dispersão das espécies por icebergs, no período pós-Würm, formulada por Darwin, em 1878, entendia que: (a) a maior parte das espécies devia ter alcançado o arquipélago, graças a outros meios naturais de dispersão (v. g. as aves e o vento); (b) outras teriam resultado de modificações causadas pelas condições do solo; (c) ainda outras teriam surgido por hibridação; e (d) uma pequena parte, teria sido introduzida pelo homem, durante as escalas feitas nestas ilhas.

Assim, das espécies de caracóis, algumas, ao tempo conhecidas como Helix aspersa [=Hélix (Cryptompbalus) aspersa], H. lactea [= Otala (Otala) lactea] e H. pisana [=Theba pisana pisana], teriam sido introduzidas por marinheiros portugueses que as usavam a bordo como alimento fresco; e outras, conhecidas como H. erubescens [=Leptaxis erubescens] e H. paupercula [=Heterostoma paupercula], originárias da Madeira, teriam sido introduzidas com a cana-do-açúcar, a primeira, e com o lastro dos navios, a segunda. Todavia, a origem das espécies introduzidas poderia ser mais longínqua como sugeria a distribuição geográfica de duas espécies de lesmas, então chamadas Viquesnelia atlantica e V. dussumieri, e que Furtado explica em carta de 30.03.1882 a G. Nevill, do Museu Indiano em Calcutá: «L'Inde, comme vous savez, a été un lieu de communications portugaises directes quelques fois avec les Açores; aussi est-il permis de supposer que quelques espèces malacologiques indiennes seraient distribuées sur nos lies dans des bois des construc tions, qu'on important pour les églises et pour des meubles, tonneaux, &; [...].» (cf. Arruda, 2002). Mais tarde viria a verificar-se que a colocação, por Morelet (1860), de V. atlantica (=Phenacolimax (Plutonia) atlantica) naquele género era incorrecta.

Ainda a propósito da origem das espécies ocorrendo no arquipélago dos Açores, Furtado (1881) concluiu, baseado nas características europeias apresentadas pelas espécies estudadas, que a colonização, tivesse sido feita quer pelos meios naturais de dispersão quer pelo homem, veio do oriente e foi estabelecida, primeiramente, em S. Miguel e Santa Maria, e que as outras ilhas foram, na sua maior parte, colonizadas a partir destas.

Concluiu também que as diferenças encontradas nas espécies açorianas relativamente àquelas da Europa não eram anomalias individuais ou diferenças etárias mas «modificações fixadas nas espécies pelas leis da hereditariedade» (Furtado, 1880).

Também tendo verificado que o número de endemismos açorianos relativamente à área das ilhas era elevado e que isso estava em desacordo com a previsão teórica, rejeitou a possibilidade de haver espécies introduzidas apenas em algumas ilhas e que formas diversas, consideradas anteriormente como espécies, fossem mais do que estados diversos de modificação de uma mesma espécie (cf. Arruda, 2001).

A ideia de haver uma menor diversidade de espécies nas ilhas açorianas relativamente ao continente de onde partiu a colonização, embora baseada em dedução de Darwin, é precursora da Teoria da Biogeografia das Ilhas ou Teoria das Faunas Insulares, apresentada em 1963 e 1967 por Robert Mac Arthur e Edward Wilson (Mac Arthur e Wilson, 1963; 1967).

Para Furtado (1884), o homem açoriano estava também diferenciado do ponto de vista etnológico, mas não encontrou respostas claras para algumas das questões que levantou. Todavia, os seus estudos levaram-no a concluir que: (a) a circunferência craniana dos indivíduos mais ou menos ilustrados é maior do que a dos camponeses que ocupam uma posição intermédia entre a daqueles e a das camponesas que é muito inferior; (b) a circunferência craniana aumenta com a altura do corpo; (c) a circunferência das camponesas é mesmo inferior à dos camponeses mais baixos; e (d) não sendo os indivíduos mais ou menos ilustrados de uma estatura superior à dos camponeses, a sua superioridade craniana deve ser atribuída ao maior desenvolvimento da sua inteligência. Porém, a sua interpretação destes resultados seguiu, claramente, a teoria de que o uso de um carácter e a falta dele são mecanismos da evolução.

Bibliografia

Arruda, L. M. (2001), Escalas nos Açores, povoamentos e Evolucionismo vistos por Arruda Furtado. In: Portos, Escalas e Ilhéus no relacionamento entre o ocidente e o oriente. Lisboa e Ponta Delgada, Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses e Universidade dos Açores, 2: 427-437.

Arruda, L. M. (2002), Correspondência científica de Francisco de Arruda Furtado. Introdução, levantamento e estudo de Luís M. Arruda. Ponta Delgada, Instituto Cultural de Ponta Delgada.

Furtado, F. A. (1880), Indagações sobre a complicação das maxilas de alguns hélices naturalizados nos Açores com respeito às das mesmas espécies observadas por Moquin-Tandon em França. Era Nova, 3: 135-147.

Furtado, F. A. (1881), A propósito da distribuição dos moluscos terrestres nos Açores. Era Nova, 1: 267-287.

Furtado, F. A. (1884), Materiais para o estudo antropológico dos povos açorianos. Observações sobre o povo micaelense. Ponta Delgada, Tip. Popular.

Mac Arthur, R. H. e Wilson, E. O. (1963), The equilibrium theory of insular Zoogeography. Evolution, 17: 373-387.

Id. (1967), The Theory of island biogeography. Princeton, Princeton University Press.

Morelet, A. (1860), Notice sur l’histoire naturelle des Açores, suivie d’une description des mollusques terrestres de cet archipel. Paris, J.-B. Baillière et fils.