(1887), Francisco d’Arruda Furtado. A Republica Federal, 2 de Agosto.
Francisco d’Arruda Furtado
Começamos hoje a registar a opinião da imprensa da capital com relação ao nosso malogrado patrício; dá-lhe jus a isso, mais do que a muita estima que nos merecia, a consideração geral que soube merecer pelo talento e pela aplicação, e o ter honrado as páginas deste semanário com vários trabalhos seus.
A publicação que encetamos é o começo e a justificação da homenagem que aqui pretendemos prestar-lhe, dando os traços biográficos da sua curta, mas fecunda, carreira científica.
Faleceu em Ponta Delgada, no dia 21 de Junho, o Sr. Francisco d’Arruda Furtado, conhecido naturalista, homem de muito mérito e ilustração, como deu testemunho nos vários trabalhos científicos que deu à publicidade. Os jornais açorianos, chegados ontem a Lisboa, lamentam profundamente o passamento do seu ilustre conterrâneo. Viveu apenas trinta e três anos. Era naturalista adjunto do Museu da Escola Politécnica e escrevia revistas no Jornal do Commercio.
Com este desventurado moço deu-se uma tristíssima coincidência. Na véspera de chegar a Lisboa a notícia do seu falecimento, havia-o a 1ª classe da Academia Real das Ciências de Lisboa proposto para seu sócio correspondente. A ciência portuguesa perdeu em Arruda Furtado um dos seus mais esperançosos cultores. Grande número de sábios estrangeiros, com quem estava em correspondência, apreciavam muito os seus trabalhos.
«Uma das suas últimas lucubrações científicas foi uma monografia sobre um interessante molusco oferecido pelo príncipe D. Carlos ao Museu da Escola Politécnica.»
(Diário de Notícias.)
(1887), Francisco d’Arruda Furtado. A Republica Federal, 9 de Agosto.
Francisco d’Arruda Furtado
Fomos ontem surpreendidos pela notícia da morte deste laborioso e distintíssimo filho dos Açores, irmão do nosso bom amigo António Furtado.
O finado foi um incansável cultor da história natural, ciência esta que o atraía e deleitava, e sobre a qual escreveu vários artigos curiosos e sensatos, alguns dos quais foram publicados nesta folha.
Arruda Furtado era bastante moço ainda. À sua dedicação e estudo deveu o nome e a reputação de que gozava já e que adquirira com incessante trabalho.
Foi empregado no Museu da Escola Politécnica de Lisboa.
Arruda Furtado morreu no dia 22 do mês findo, na ilha de S. Miguel, donde era natural. Deixa viúva e um filhinho.
Sentimos muitíssimo a perda daquele tão prestante cavalheiro, e à sua família e especialmente a seu irmão, o Sr. António Furtado, enviamos os nossos pêsames.
(Século)
Não há muitos meses que nos despedíamos neste jornal do nosso estimável colega da secção científica. Francisco d’Arruda Furtado, que ia buscar à sua terra natal alívio a uma cruel doença que o ia minando lentamente. Partia para os Açores, alquebrado e triste, mas cheio de esperança de voltar ainda aos afectos que entre nós deixava e aos trabalhos que tinha de interromper, apesar de constituírem o enlevo quase exclusivo da sua vida fora da família.
Ainda nos Açores, e já o seu nome nos chegara como dum cultor distinto, das ciências naturais. Sobre a antropologia dos Açores, se bem nos recordamos, publicara ele há anos um magnífico estudo, que não só passava a ser logo conhecido entre nós, mas que no estrangeiro merecia os elogios de sábios distintos, entre eles Darwin, com quem o Sr. Arruda Furtado se correspondia. Vários outros estudos e monografias sobre a fauna açoriana se devem ao ilustre naturalista, que apesar de ter vivido sempre na obscuridade, conseguiu dotar a ciência portuguesa com aquisições de origem própria, que têm servido de informação e auxílio aos naturalistas estrangeiros.
Era especialmente ao estudo dos moluscos que ele se votava. Ultimamente fora pelo Sr. Barbosa du Bocage feita na Academia a descrição e o elogio de um seu excelente estudo e classificação de uma lula, assaz rara que por el-rei fora oferecida ao Museu da Escola Politécnica, onde Arruda era conservador.
Essa memória, verdadeiramente científica, conjuntamente com outros trabalhos anteriormente publicados, serviram já de base para há poucos dias ainda, ele ser proposto sócio da Academia Real das Ciências, onde evidentemente ia entrar, par droit de conquête.
Arrebatou-o porém a morte na força da vida e, pode bem dizer-se que foi o trabalho e a luta que o mataram. Arruda Furtado trabalhava incessantemente, muito por temperamento e amor do estado, no remanso do seu gabinete ou em longas excursões pelos campos em explorações científicas, e um pouco por necessidade, porque tendo constituído família, a luta pela existência tornava-se-lhe ultimamente mais cara.
Há pouco mais de um ano entrava a fazer parte da redacção deste jornal, e os nossos leitores recordam-se bem da grande soma de conhecimentos, nos diversos ramos das ciências, e o são critério, revelados por aquele nosso malogrado colega nas suas excelentes Revistas Científicas, que semanalmente publicávamos, e só se interromperam quando a doença obrigou Arruda Furtado a ausentar-se de Lisboa, à busca de umas problemáticas melhoras na terra da sua naturalidade.
Ele ia cheio de fé no seu restabelecimento; mas a tísica minaz já tinha projectado visivelmente na fisionomia do infeliz moço as sombras fatais da morte, que em volta dele pairava. Nós nunca mais contámos tornar a apertar-lhe a mão leal.
Arruda Furtado deixa mulher e um filho, que terá um ano, o muito, e que era os encantos dele como pai e como homem de ciência. Era a criança um admirável produto, e quando tinha talvez um mês, andava já o pai com a fotografia do menino, mostrando aos amigos aquele belo exemplar, que ele se orgulhava intimamente de haver produzido. – Na proximidade do seu passamento, admirava-se talvez inconscientemente de ter dado origem àquele magnífico exemplar de força e de Saúde.
Pesava-o então quase todos os dias, tomava notas de todas as manifestações do seu desenvolvimento físico e intelectual, e hão-de os nossos leitores estar lembrados de uma excelente revista, que a propósito da criança e de observações nela feitas ele publicou nesta folha, o que é, fora de toda a dúvida, uma bela página de psicologia infantil.
Sentimos não nos poder alongar nesta notícia, prestando a devida homenagem à memória do estimável amigo e colega que perdemos, o do formoso espírito que se apagou, constituindo uma verdadeira perda para a ciência portuguesa. Mas estas linhas não têm a pretensão de fazer a apologia dos merecimentos do finado amigo, sim unicamente prestar-lhe o devido preito da nossa saudade.
Descanse em paz o seu espírito e receba a sua família a expressão da nossa sincera mágoa, podendo um dia o filho que Arruda Furtado deixa entre nós, ser o legítimo representante e o herdeiro das altas qualidades de coração, de inteligência e de caracter de seu infeliz pai!
Porque é mister que se diga, e este é o seu maior elogio, – Arruda Furtado era um homem exemplarmente honrado.
(Jornal do Commercio)
(1887), Francisco d’Arruda Furtado. Morte de um naturalista. A Republica
Federal, 16 de Agosto.
Francisco d’Arruda Furtado
Morte de um naturalista
O vapor “Funchal”, entrado ontem dos Açores, trouxe a notícia de se ter finado, em Ponta Delgada, vítima de uma tísica na laringe o distinto naturalista Francisco d’Arruda Furtado.
São apreciadíssimos, no estrangeiro e em Portugal, os seus estudos de conquiologia açoriana e as suas notáveis investigações sobre a origem dos primeiros povoadores da ilha de S. Miguel. Para a Biblioteca do povo e das escolas, Arruda Furtado escreveu um volumezinho, intitulado O macho e a fêmea no reino animal, trabalho que está à altura do assunto de que trata.
Foi ele que nos Açores levantou pela primeira vez a questão da descendência do homem, segundo a aplicação da teoria de Carlos Darwin, que algumas vezes o honrou, com animadoras palavras, como ainda ultimamente, o sábio Dr. Gustavo Le Bon.
Arruda Furtado era uma inteligência vastíssima, e possuidor de grande número de conhecimentos de história natural, uma das maiores honras da terra que lhe deu o berço, e um dos mais notáveis naturalista do nosso país.
O seu enterro foi concorrido pelos micaelenses mais ilustrados, e sobre o túmulo o Sr. Eugénio Moniz recitou uma poesia, elevando as superiores qualidades do finado.
(Jornal da Noite)
(1887), Uma perda lamentável. A Republica Federal, 16 de Agosto.
Uma perda lamentável
Na noite de 22 de Junho, pelas 11 horas, faleceu em Ponta Delgada (ilha de S. Miguel) o Sr. Francisco d’Arruda Furtado, conservador do museu da Escola Politécnica de Lisboa, uma verdadeira notabilidade como classificador em história natural, e que deixou afirmadas as suas poderosas faculdades e muito estudo no importantíssimo livro – Materiais para a antropologia do povo açoriano (I Vol.), e em vários outros trabalhos de inapreciável valor, dispersos em diversas publicações.
Arruda Furtado possuía cartas muito honrosas de Gustavo Le Bon e de Darwin, pedindo-lhe indicações antropológicas e outras com respeito aos Açores e a Portugal.
Morreu muito moço aquele pobre rapaz, que à força de estudo e perseverança conseguira fazer conhecidos e apreciados o seu grande talento e capacidade.
Matou-o o clima traiçoeiro de Lisboa.
Vindo da ilha de S. Miguel para exercer o lugar de conservador do Museu da Escola Politécnica quando a vida começava a sorrir-lhe e constituíra família, uma constipação que em breve degenerou em tísica, roubou aquela preciosa existência, que tanto já fizera em honra da pátria e tanto prometia!
Os nossos profundos sentimentos à desolada viúva e ao irmão do falecido, o nosso amigo António Furtado.
(A Folha do Povo)
(1887), Francisco d’Arruda Furtado. A Republica Federal, 23 de Agosto.
Francisco d’Arruda Furtado
Só pelo último número do Povo d’Aveiro soube que tinha falecido em Ponta Delgada o naturalista Francisco d’Arruda Furtado. Na minha luta tenaz com os torpes, nesta guerra sem tréguas que me apraz mover a todos os especuladores da sinceridade popular, é com o mais vivo sentimento e o mais profundo pesar que vejo cair por terra todos os trabalhadores honestos, todos os talentos aproveitáveis que se distinguem, pela linha recta do seu saber, dessa turba multa de ambiciosos que para aí vivem na falsificação dos bons princípios. Francisco d’Arruda Furtado era desses, um bom talento, um escritor modesto e desprendido, um obreiro corajoso na derrocada dos velhos preconceitos e das más doutrinas.
São tanto mais sinceras as minhas palavras, quanto é certo que não tinha mínima relação pessoal com esse morto ilustre. Mas conhecia-o pelas suas produções científicas e é quanto me basta. Não preciso de mais. Pude apreciar o seu valor, já nas suas publicações jornalísticas, já nos panfletos de combate como o Homem e o macaco, já em outras tantas manifestações do seu talento vigoroso.
Daí os meus respeitos pelo seu nome e o meu pesar pela sua morte prematura. Tenho amor a esses lutadores honrados, modestos mas firmes no seu fim, que só procuram o bem dos outros mesmo com sacrifício do bem próprio. São esses os beneméritos da humanidade, não obstante ficarem obscuros muitas vezes enquanto os charlatões vivem na glória e... no galarim.
Que descanse em paz esse malogrado moço, que dispensou talvez muitos dos seus interesses para viver um pouco na ciência. Terá vivido pobre pelo lado material, mas viveu rico no espírito. Compreendeu que a missão do homem é mais alguma coisa que satisfazer aos seus instintos animais. Cumpriu o seu dever, e é esse o maior galardão que a sua memória nos merece.
(Povo d’Aveiro. Do correspondente em Lisboa, 22 de Julho)
(1887), Arruda Furtado. A Republica Federal, 23 de Agosto.
Arruda Furtado
Faleceu em S. Miguel, Açores, no dia 22 de Junho o erudito cultor da história natural, Sr. Francisco d’Arruda Furtado, irmão do nosso bom e prezado amigo António Furtado. Sentimos, como nossa, a dor profundíssima que deve dilacerar o coração do nosso caro amigo António Furtado, e, já que a distância nos não permite acompanhá-lo pessoalmente, de longe lhe enviamos um fraternal abraço, e tomando como nosso o desgosto que sofre, pedimos-lhe resignação. À ilustre família do nosso bom amigo, e à inconsolável viúva do finado os nossos mais sinceros pêsames.
(O Combate, Tavira)
(1887), Arruda Furtado. A Republica Federal, 23 de Agosto.
Arruda Furtado
Há pouco noticiámos neste jornal que viera da Madeira para Ponta Delgada gravemente atacado de uma tísica de laringe, o Sr. Francisco d’Arruda Furtado, e hoje temos de noticiar a morte desse belo rapaz – 30 anos apenas – que era já um açoriano distintíssimo no campo da ciência.
Arruda Furtado era o único naturalista dos Açores muito considerado no estrangeiro pelos seus trabalhos sobre concheologia, e correspondia-se com sábios do estofo de Darwin, Gustavo Le Bon e outros.
Ultimamente esteve empregado no Museu Zoológico de Lisboa, onde fez valiosos serviços, merecendo os maiores elogios do Sr. Barbosa du Bucage.
Devia ser de futuro uma das glórias do país, mas a morte destruiu brutalmente todas as esperanças.
Lastimamos sinceramente a grande perda que acabam de sofrer os Açores com a morte deste infatigável trabalhador.
Deixou esposa e um filhinho; a estes consolá-los-á – se é que há consolação nestas grandes dores – a ideia de que Arruda Furtado foi sempre um homem de espírito e de coração, um caracter honesto e bom.
(O Açoriano, Horta)
(1888), [notícia sem título]. Journal de Conchyliologie, 36: 120-121.
M. Arruda Furtado né le 17 septembre 1854, à Ponta Delgada, dans l’île Saint-Michel, du group des Açores, y est mort le 21 juin 1887, à 33 ans, des suites d’une maladie des voies respiratoires, qui avait fait de rapides progrès et ne laissait plus aucun espoir. Il avait un goût inné, une véritable vocation pour les sciences naturelles, et, d’après ses premiers travaux, dont plusieurs ont été publiés dans notre Recueil scientifique, on peut facilement prévoir que, s’il avait vécu, il aurait certainement fait honneur au Muséum d’Histoire naturelle de Lisbonne, auquel il était attaché. H. Crosse. |